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Ponto de vista

Em abril já estava claro que a Evergrande estava entrando em território negativo, afirma Quasar

Em abril já estava claro que a Evergrande estava entrando em território negativo, afirma Quasar

Na última semana, o mercado foi tomado por uma onda de estresse e volatilidade causada pela crise da incorporadora chinesa Evergrande, que detém uma dívida de cerca de US$ 300 bilhões, e mostra dificuldades para honrar seus compromissos de curto prazo. No entanto, aparentemente a situação parece cada vez mais controlada, com agentes apostando em uma intervenção do governo da China para evitar um colapso da empresa e de uma possível contaminação do setor imobiliário do país.

Convidamos, então, Ulisses de Oliveira, cogestor dos fundos Quasar International, asset independente com R$ 3,4 bilhões sob gestão, para comentar as perspectivas da Evergrande, do setor imobiliário na China e do impacto no mercado global.

Confira abaixo as respostas do especialista em bonds e mercados emergentes ao B.Side Insights:

B.Side – Vocês investiram durante quanto tempo em títulos da Evergrande e como foi a decisão de zerar a posição na empresa? Quando o case começou a ser arriscado demais na visão de vocês?

Ulisses de Oliveira – Já havíamos comprado e vendido outrora, mas a última vez foi em abril de 2021, portanto houve bastante tempo para qualquer investidor sair do papel, na casa dos US$ 87 (atualmente em US$ 25/27).

Já em abril, e sendo a referência do setor (principalmente para o mercado High Yield em Mercados Emergentes) estava claro para a equipe que o book value (valor contábil) da empresa de construção estava entrando em território negativo face suas participações em coligadas (em particular a New Energy, empresa de veículos elétricos que até hoje ainda não produziu nenhum carro). Para nós bastava.

B.Side – O que acontecerá na opinião de vocês com a Evergrande? Haverá default (calote)? Haverá uma intervenção do governo chinês?

Ulisses de Oliveira – Hoje, o mercado já cogita uma intervenção do governo chinês na companhia. Acreditamos que para haver uma forma ordenada de recebimento dos compromissos é preciso:
1) entregar as unidades aos mutuários 2) garantir o pagamento à cadeia de insumos 3) pagar os credores bancários (estatais chineses) e PFs com “trust loans” (empréstimos de curto prazo, uma espécie de “hot money“). Não necessariamente nesta ordem. Não acreditamos em Nirvana para os debenturistas locais, bondholders estrangeiros e/ou acionistas, sendo que o acionista principal da companhia, provavelmente, terá que dar boas explicações ao Partido Comunista da China (PCC) sobre toda essa bagunça.

B.Side – Como vocês enxergam atualmente o mercado imobiliário da China em geral diante dessa crise da Evergrande?

Ulisses de Oliveira – O mercado imobiliário chinês passa por um momento de alta volatilidade devido as incertezas geradas pela crise da Evergrande. Porém, o setor deve normalizar após a definição da restruturação da empresa com credores, criando oportunidades de investimento assimétricas no setor com empresas mais bem posicionadas e com melhor perfil de endividamento. Em todo caso, o mercado imobiliário representa grande parte do PIB chinês e é do interesse do governo garantir que os imóveis sejam entregues para evitar diminuição da confiança no setor e queda generalizada nos preços de imóveis.

B.Side -Há algum paralelo com o Lehman Brothers? O que é equiparável e o que é totalmente diferente de 2008?

Ulisses de Oliveira – Absolutamente não. Se compararmos a exposição bancária ao setor de imobiliário para a Evergrande, temos que: representa 5,3% do total do setor de construção, 3,2% do setor imobiliário e 0,17% do total de empréstimos, portanto, vemos aqui que os números têm interdependência. Além disso, pelo fato de o setor imobiliário ser um importante bastião da economia chinesa (representa 25% do PIB), a mesma tem um comando planificado e centralizado e o seus consumidores não tão alavancados em hipotecas quanto eram os americanos. A razão primária das 3 linhas vermelhas (política do governo da China) é frear um potencial Lehman 2008. Temos ainda que o mercado de capitais/bancos, na média, representa 24% para todos as construtoras (1S21), sendo assim não é seu principal meio de financiamento para atividades de desenvolvimento imobiliário, e sim pagamentos de pré-vendas de cliente com 49% do total, seguido de 27% de injeções dos próprios acionistas para começar tais empreendimentos. Sim, temos um processo de arrefecimento de preços, temos um barco em águas turbulentas, a Evergrande irá se danificar no processo, pode ter outras (a China tem entre 20 e 25 mil construtoras no continente, das quais aproximadamente 80 são listadas em Hong Kong), mas não vemos paralelos.

B.Side – Atualmente, como vocês estão posicionados em China?

Ulisses de Oliveira – Nosso fundo tem aproximadamente 26% em China. Acreditamos que a saída do “elefante da sala”, digo Evergrande (a qual já não tínhamos conforme dito acima desde abril 2021), representa o ponto de inflexão do mercado e estamos posicionados para a volta. Tudo que cai, sempre volta, basta lembrar de 2020. Vida que segue…

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